terça-feira, setembro 23, 2008

Simples

Uma novidade desagradável do pós-modernismo é o surgimento do Homo Complicatus.

Houve um tempo em que homens costumavam ser criaturas simples. Os provedores do lar. Mas ainda muito mais simples que isso possa parecer. Homens eram simples como peixinhos ornamentais: de acordo com seu tamanho, era determinada a dimensão do aquário em que ele deveria ser criado. Bastava, então, que você o alimentasse na proporção adequada para que ele mantivesse suas funções de acordo com o esperado e não virasse uma bola e morresse. Que você mantivesse a água aquecida o suficiente para que ele não congelasse – nem cozinhasse. E ele não teria nenhum tipo de desculpa na hora da reprodução. Nada de “estou cansado”, ou “desculpa, fiquei nervoso”, ou “isso nunca me aconteceu antes”. Coisa simples, sabe?

Agora não. Agora eles têm crises. Querem conhecer o oceano, trocar de ração, mudar a cor das pedrinhas decorativas, sentem-se angustiados com as bolhas de oxigênio, sufocados pelas algas, pedem vizinhos, mas também fazem questão de ficar sozinhos, exigem que você tire aquele mergulhador com escafandro de gesso porque ele está chamando atenção demais.

Até onde me lembro, complicação era característica de mulher. Mulheres e seus desequilíbrios hormonais; suas tensões pré, pós e durante as menstruações; suas neuroses; dietas loucas; pânico de celulites; inseguranças; enxaquecas; cólicas; efeito sanfona; carências; compulsões por compras e chocolates; bruscas mudanças de humor; a inexplicável (para um homem, claro) necessidade de ter pelo menos cinco pares de sapatos pretos.

Ser maluca era “natural” das mulheres.

E de outra parte existiam os homens. Com suas vozes graves, mãos grandes, desejo sexual constante, necessidade de posse sobre o controle remoto da TV, inabilidade para diálogos sensíveis e incapacidade de fazer duas coisas ao mesmo tempo. As coisas eram simples, eu lembro!

Hoje a gente dá de cara com criaturas estranhas. Parecem homens, falam como homens, andam como homens. Mas têm medo de filme de terror e não podem ver sangue (nem no bife, que deve ser muito bem-passado). São desorganizados e até meio porcos, típicos machões. Mas inventam de ter frescuras logo na cama! Não querem sexo porque o dia foi difícil, porque precisam acordar cedo ou porque comeram demais no jantar. A luz tem que estar apagada, a cortina fechada, o lençol esticado, o telefone fora da tomada, os astros no céu em perfeita conjunção, precisam beber um pouco pra relaxar, mas não demais! Se não, já era.

Além disso, nunca sabem o que querem. Não estão prontos, nem sabem pra quê. Não sabem explicar. Nem entender. Tudo é tão difícil, tão confuso. Oh, vida.

Ai, que chatice.

Se eu quisesse complicação assim, ficava com uma mulher (ao menos as conversas seriam mais divertidas e poderíamos compartilhar roupas). Carinho, respeito, reciprocidade e tesão. A receita é bem simples.

Existe beleza na complexidade, mas não na complicação. Não devemos ser simplistas, mas a simplicidade, na maior parte das vezes, é – simplesmente – a medida certa.